terça-feira, 16 de março de 2010

A química do bem


Química do bem
Cientistas da USP investigam propriedades de líquidos iônicos tensoativos – solventes “verdes” que poderão ter inúmeras aplicações industriais. Trabalho é capa da Journal of Colloid and Interface Science.

Química do bem

10/3/2010

Por Fábio de Castro


Agência FAPESP – Compreender as propriedades dos líquidos iônicos – alternativa reciclável aos solventes convencionais utilizados em processos industriais – tem sido uma preocupação crescente para cientistas em todo o mundo, já que esses produtos têm inúmeras aplicações coerentes com os preceitos da "química verde", um conjunto de diretrizes que visa à redução do impacto ambiental dos processos químicos.

Um estudo realizado por pesquisadores do Instituto de Química (IQ) da Universidade de São Paulo (USP) acaba de contribuir para o avanço do conhecimento sobre uma categoria especial desses compostos: os líquidos iônicos tensoativos, que poderão ter aplicações importantes, especialmente na descontaminação de água.

O trabalho acaba de ser publicado na edição on-line da Journal of Colloid and Interface Science e será capa da edição de maio da revista.
A pesquisa faz parte da tese de doutorado de Paula Decot Galgano, orientada por Omar El Seoud, professor do Departamento de Química Fundamental do IQ-USP, que divide com a aluna a autoria do artigo. O trabalho foi feito no âmbito do Projeto Temático “Síntese, propriedades e aplicações de tensoativos e biopolímeros funcionalizados: um enfoque de Química Verde”, coordenado por El Seoud e apoiado pela FAPESP.

O termo “líquidos iônicos tensoativos” (SAIL, na sigla em inglês) foi lançado na literatura internacional pelo grupo de El Seoud, em 2007. De acordo com o professor, o fato de o artigo ter sido escolhido para figurar na capa da revista é uma conquista para a ciência brasileira.

“Estamos contentes pela escolha, pois ela reflete o impacto da nossa contribuição científica, além do reconhecimento da importância do assunto”, disse El Seoud à Agência FAPESP.

Segundo o professor, os líquidos iônicos são denominados solventes “verdes” por possuírem propriedades especiais. “Eles têm alta polaridade, uma excelente estabilidade química e térmica – o que permite a reciclagem do solvente no processo industrial – e pressão de vapor extremamente baixa. Na prática, isso significa que podem ser empregados como solventes em um processo industrial sem perigos de explosão ou de fogo”, explicou.

O que distingue os líquidos iônicos tensoativos é a presença em suas estruturas de cadeias alquílicas compridas – o que confere a eles poderes de emulsificação e de suspensão, por exemplo. “Esses compostos formam micelas – agregados que conseguem incorporar certos contaminantes", disse.

A solução é então filtrada através de uma membrana que deixa passar apenas a água, retendo as micelas com os contaminantes. "Além da descontaminação de água de compostos aromáticos policíclicos, compostos clorados e metais pesados, os líquidos iônicos tensoativos têm potencial para outras aplicações importantes, por exemplo, como a catálise homogênea de reações químicas diversas”, declarou.


Como se trata de um assunto essencialmente novo, a primeira etapa das pesquisas, segundo El Seoud, consiste no estudo das propriedades das soluções de líquidos iônicos tensoativos a fim de otimizar as condições de suas aplicações.

“Se pudermos conhecer detalhadamente essas propriedades, poderemos definir, por exemplo, quais as melhores faixas de concentração e temperatura para aplicação desses tensoativos. Esse é exatamente o enfoque do artigo e da tese de Paula”, disse o professor.


Tensoativos verdes


Os líquidos iônicos tensoativos empregados no estudo foram os cloretos de 1-alquil-3-metilimidazólio, com grupo cadeias carbônicas de 10 a 16 átomos de carbono.
Segundo El Seoud, esses tensoativos são produtos “verdes”, pois a parte alquílica é feita pela transformação de alcoóis graxos, obtidos pela hidrogenólise de óleos e gorduras nos cloretos correspondentes.

“Os mais notáveis exemplos de líquidos iônicos são os derivados de um composto heteróclito, o imidazol. Um desses derivados, que pretendemos empregar de agora em diante nas pesquisas, é o 4(5)-hidroximetilimidazol, que pode ser obtido a partir da frutose, o açúcar das frutas. Assim estaremos pesquisando líquidos iônicos à base de açúcares”, disse.

O artigo Micellar properties of surface active ionic liquids: A comparison of 1-hexadecyl- 3-methylimidazolium chloride with structurally related cationic surfactants, de Paula Decot Galgano e Omar El Seoud, pode ser lido por assinantes daJournal of Colloid and Interface Science em

http://www.sciencedirect.com/science/journal/00219797

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